Edicões Gambiarra Profana/Folha Cultural Pataxó




"Minha Poesia não usa vestes para se camuflar, é livre e nua" (Arnoldo Pimentel)

"Censurar ninguém se atreverá, meu canto já nasceu livre" (Sérgio Salles-Oigers)

"Gambiarra Profana, poesia sem propriedade privada, livre como a vida, leve como pedra em passeata" (Fabiano Soares da Silva)

"Se eu matar todos os meus demônios, os anjos podem morrer também" (Tenneessee Williams)

terça-feira, 7 de novembro de 2017

A BATALHA NEGRA OU OS HOMENS QUE ESTAVAM NA VARANDA SE PROTEGENDO DA TEMPESTADE SOBRE O BOSQUE


- Menininho, venha aqui pra dindinha ajeitar esse uniforme. Hoje é seu primeiro dia na escola, tem que ir bonito.

O menininho foi até a dindinha que ajeitou o uniforme.
- Menina, cuidado com ele no caminho pra escola.
- Está bem tia.
- Agora vão pedir a benção a vovó e a mamãe.

A menina e o menininho foram a até vovó, a abraçaram e disseram:
- Sua benção vovó.
- Deus abençoe vocês.

Depois foram até a mãe:
- Sua benção mamãe.
- Deus abençoe.

A mãe se abaixou, abraçou e beijou o menininho, depois abraçou e beijou a menina.
- Não se esqueçam da dindinha. – Disse a vovó.

Eles abraçaram a dindinha e pediram a benção.
- Deus os abençoe meus anjos.

Quando estavam saindo pela porta da sala, a mãe disse:
- Menina, cuidado com ele, não atravesse na bomba, é perigoso, passe pelo parque para atravessar a rua.
- Sim senhora mamãe.

Eles saíram da casa, a menina fechou o portão e seguiram o caminho da escola pelo canto da calçada. Foram devagar e o menino parecia tranquilo, sem aquele medo da escola que era tão comum, depois de alguns minutos caminhando passaram pelo parque.

- A mamãe falou para atravessar pelo parque. – Disse o menino.
- Pela bomba é mais perto, não tem perigo. – Disse a menina
- A mamãe falou. – Disse o menino.
- Está bem, vamos pelo parque. – Disse a menina voltando e entrando no parque.

O parque de diversões ficava num terreno grande e só funcionava nos fins de semana, mas tinha a passagem livre e as mães preferiam atravessar por ali e não pelo posto de gasolina, chamado por alguns de bomba. Eles atravessaram a rua e seguiram em direção à escola. Um pouco antes da escola o menino parou.
- Menina, que lugar é esse todo de pedra?
- É um lugar aonde as pessoas buscam coisas invisíveis.
- É bonito lá dentro?
- Dizem que é muito bonito.
- E lá em cima, o que é?
- É uma torre, de lá dá pra ver muito além do mar.
- E você acredita em coisas invisíveis?
- Acredito, mas às vezes tenho medo.
- Medo de que?
- De crescer e deixar de merecer.
- Mas todos nós vamos crescer.
- É disso que tenho medo, de crescer.
- De crescer?
- De crescer e não ver mais o céu.
- Mas...
- Agora chega de conversa, chegamos na escola.

A escola parecia grande, e ficava ao lado da igreja de pedra, tinha dois pinheiros na entrada e dois lá nos fundos, depois do pátio, junto ao muro. O menino sentiu um certo tremor, mas foi em direção ao portão sendo puxado pela menina que estudava ali mesmo, ele olhou e entrou.

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

BATALHA DO PACÍFICO

A BATALHA DO PACÍFICO


         O avião pousava no meio da rua. A rua era comprida e larga. Quase não havia casas. Eu costumava ficar na calçada da farmácia e de lá podia ver quando fazia a curva próximo da serra. Nesse momento eu saía correndo com os braços abertos como se estivesse num voo rasante sobre meu alvo numa batalha e ia, com os outros garotos da minha idade ver o pouso de perto.
          Depois de pousar o piloto agradecia os aplausos, nos abraçava e seguia para a padaria para tomar um café e conversar. Nós ficávamos ali, perto do avião, olhando todos os seus detalhes, esperando a hora de levantar voo. Era um avião daqueles usados na segunda guerra pelos americanos. Um avião com suas glórias e seus pecados. Um avião com seus sonhos e seus pesadelos.
          Eu gostava tanto que perturbei um vizinho que trabalhava com madeira até aprender fazer pequenos aviões. Fiz uns cinco aviõezinhos  de madeira e brincava com eles na varanda da casa onde morava. Tinha voos rasantes e terríveis batalhas aéreas.
         Um dia a rua foi diminuindo, muitas casas foram nascendo e o avião que ali pousava desapareceu, assim como meus aviões de brinquedo, que foram sendo deixados de lado conforme o tempo passava e eu crescia.
         De repente me vi numa batalha muito pior, muito mais difícil que aquelas aéreas no tempo de criança, mais real que Memphis Belle ou os filmes de batalhas aéreas com John Wayne, Gregory Peck ou Clark Gable, aquela que todos nós enfrentamos um dia, a batalha da vida. A batalha que por mais que façamos, por mais que lutamos, com lágrimas ou sorrisos, com chegadas ou partidas, com flores raras ou flores simples, daquelas lindas, colhidas em qualquer jardim, um dia chega ao seu fim.
Autor: Arnoldo Pimentel