Edicões Gambiarra Profana/Folha Cultural Pataxó




"Minha Poesia não usa vestes para se camuflar, é livre e nua" (Arnoldo Pimentel)

"Censurar ninguém se atreverá, meu canto já nasceu livre" (Sérgio Salles-Oigers)

"Gambiarra Profana, poesia sem propriedade privada, livre como a vida, leve como pedra em passeata" (Fabiano Soares da Silva)

"Se eu matar todos os meus demônios, os anjos podem morrer também" (Tenneessee Williams)

sábado, 16 de agosto de 2014

SOBRE AS CORES DO DIA ANTERIOR

        Depois da chuva que durou a noite toda e parte da manhã a caminhonete parou em frente ao portão na rua silenciosa. O motorista buzinou para avisar ao morador que estava esperando. O homem de certa idade abriu a janela de madeira pintada de verde da casa pintada de branco e pediu que esperasse um minuto, fechou a janela, pegou duas sacolas que estavam sobre a mesa, depois pegou o maço de cigarros e os fósforos e colocou no bolso da camisa. Saiu da casa encostando a porta atrás si sem se preocupar em passar a chave, caminhou pelo quintal com dificuldade por causa da lama e da idade, abriu o portão, saiu, encostou o portão e entrou na caminhonete.

- Não vai trancar a porta da casa e o portão? – Perguntou o amigo.
- Não há quase nada na casa, só história, e talvez sem importância.
- Aonde vamos?
- Na paróquia, vou levar essas sacolas para a caridade.
- O que tem nas sacolas?
- Carne, decidi não comer mais carne.

O motorista ligou o veículo e foram devagar pela estrada molhada.
- Depois da paróquia você vai trabalhar?
- Não há o que colher, nem mais o que fazer.
- Sempre tem alguma coisa pra colher ou fazer.
- Não, não tem nada.
- Insisto que sempre há o que colher ou fazer.
- Não insista, não há mais nada para salvar nesse lugar.
- Se pensa assim.
- É a realidade. Tudo foi feito em vão. Foi um engano.
- E você pretende ir a algum lugar depois da paróquia?
- Pretendo passar nas trincheiras e ver os resíduos.
- Nas trincheiras só tem mortos.
- E nós o que somos? Vivos? Você acredita que somos vivos?


Arnoldo Pimentel