Encostou
o carro no pequeno café que fica um pouco antes da ponte sobre o rio, desceu do
carro, fechou a porta e foi até a ponte, encostou no parapeito e olhou o rio lá
embaixo, levantou a cabeça para olhar um pouco o céu aberto e pode ver lá longe
um bando de pássaros rumo ao norte, imaginou os sorrisos quando chegarem e o
silêncio na paisagem, agora neutra, de onde saíram. Ficou um tempo olhando o
céu e os pássaros, até que estes por fim desapareceram na distância, gostava de
viajar assim, sentia-se como aqueles pássaros que cortaram o céu rumo ao norte.
Depois de alguns minutos caminhou em direção ao pequeno café na beira da
estrada, onde deixou o carro estacionado, chegou à porta e entrou, sentou em um
canto próximo a janela e pediu algo para comer.
- Por
favor, tem um telefone que eu possa usar? – Perguntou a garçonete quando pagou
a conta.
- Lá nos
fundos do lado de fora. Tem moedas?
- Tenho o
suficiente, não vou demorar. A senhorora sabe onde tem um hotel para passar a
noite?
- É só
seguir a estrada.
Saiu do
café e foi até os fundos, pegou o telefone, discou e aguardou alguém atender do
outro lado.
- Alô –
Disse a voz do outro lado
- Sou eu,
tudo bem?
- Sim,
você sumiu, disse que iria viajar e não se despediu.
- Não
gosto muito de despedidas, estou viajando a trabalho.
- Já faz
dois meses, sinto sua falta.
- Eu
também tenho saudades.
- Você é
muito importante pra mim.
- Você
também é muito importante pra mim, você sabe disso.
- Sei.
- Conseguiu o papel?
- Sei.
- Conseguiu o papel?
- Sim,
consegui, estamos em cartaz há um mês.
- Você
tem futuro.
- Você me
ajudou muito passando o texto comigo para o teste.
- Eu
gosto muito de teatro, pena que minha ocupação não me permite ir sempre.
- Eu
tenho me dedicado muito para estar sempre bem no palco.
-
Tenneesse Williams é meu autor preferido e você só vai melhorar, tenha certeza.
- A
montagem é simples, alternativa, mas é meu primeiro personagem importante, a
ansiedade é grande.
- Eu
entendo, mas você irá se superar, tem talento, nasceu para isso.
- Espero que sim, não quero fazer outra coisa na vida, além de interpretar.
- Você consegue mancar e passar o sentimento de inferioridade bem no palco?
- Sim, e você se interpretasse, qual personagem do Tenneesse gostaria de interpretar?
- Estou mais para Blanche DuBois, rsrs
Houve um silêncio cortado pelo caminhão tanque que passou buzinando na estrada, que logo também silenciou desaparecendo no vento.
- Espero que sim, não quero fazer outra coisa na vida, além de interpretar.
- Você consegue mancar e passar o sentimento de inferioridade bem no palco?
- Sim, e você se interpretasse, qual personagem do Tenneesse gostaria de interpretar?
- Estou mais para Blanche DuBois, rsrs
Houve um silêncio cortado pelo caminhão tanque que passou buzinando na estrada, que logo também silenciou desaparecendo no vento.
- Você
volta quando? Quero tanto que venha assistir a peça.
- Minhas
datas não são previsíveis, poderei ficar meses fora.
- Mas e
seu apartamento?
- É
praticamente para quando estou de férias e quando levo o trabalho para terminar,
organizar, por isso ele está sempre fechado, eu vivo praticamente na natureza,
para estudá-la.
-
Então nos conhecemos quando você estava de férias?
- Sim,
por isso não me espere, não se prenda a mim.
- O grupo
deve viajar com a peça, terei que ir junto, deixarei o roteiro por baixo da
porta.
- Talvez
a gente nunca mais se veja, não se prenda.
- Eu
pensei...
- Não
pense, por favor.
- Não sei
se conseguirei.
- A
ligação está no fim e preciso seguir viagem antes de anoitecer.
- É um
adeus?
- Não
sei, não sei se terei tempo um dia, mas confesso que queria, queria muito.
- Fiz um
poema pra você, quer ouvir?
- Quero,
diz.
- Espere,
está por aqui.
- Não
demore.
- Achei,
ouça:
QUARTO
Meu
coração
Insiste
em sorrir
Com a
chegada dos pássaros
Que cortam
o céu até aqui
Mesmo
sabendo que quando se vão
Em
revoada
Deixam o
silêncio
Na
paisagem neutra
Do meu
inverno
Houve um
breve silêncio.
- Gostou?
- Perguntou a voz do outro lado
- Gostei
muito, mas é triste.
- É, um
pouco, esse poema sou eu.
-
- Você
ainda está ai? Alô, alô, alô.
Arnoldo
Pimentel